“Tudo a magoa.” “Chora por tudo e por nada.” “Fica triste com uma palavra mais dura.”
Se te revês nestas frases, respira fundo. Provavelmente, tens uma criança sensível em casa e isso não é um defeito. É uma característica. Uma que, quando bem compreendida e acompanhada, pode transformar-se num dos maiores superpoderes da infância.
Neste artigo, vou mostrar-te como reconhecer os sinais de uma criança sensível, como podes apoiá-la sem cair na armadilha da superproteção, e de que forma podes ajudá-la a crescer emocionalmente mais segura, confiante e resiliente.
O Que É Uma Criança Sensível?
Ser sensível não é ser fraco. Nem “mimado”. Uma criança sensível é aquela que sente tudo com mais intensidade: as emoções, os sons, as palavras, os ambientes. O seu sistema nervoso parece captar tudo com mais detalhe.
É aquela criança que:
- Se assusta facilmente com sons altos.
- Reage com lágrimas a uma repreensão pequena.
- Nota quando alguém está triste e tenta consolar.
- Fica angustiada com mudanças ou ambientes caóticos.
- Tem dificuldade em “deixar passar” quando algo corre mal.
A sensibilidade pode ser sensorial (à luz, ao som, ao toque), emocional (às críticas, às injustiças), ou relacional (quando sente que alguém a rejeitou ou ignorou). Não é um problema a resolver, mas uma forma de estar no mundo.
Vantagens (Sim, Vantagens!) de Ser Uma Criança Sensível
Antes de falar em estratégias, vale a pena lembrar-te de que esta sensibilidade traz qualidades únicas. Crianças sensíveis tendem a ser:
- Muito empáticas.
- Observadoras e criativas.
- Ligadas à natureza e aos animais.
- Profundas nos seus pensamentos e emoções.
O mundo precisa de pessoas assim. Mas, para não se sentirem constantemente “demais” ou “erradas”, precisam de adultos que as aceitem como são e que saibam como guiá-las sem as sufocar.
O Risco da Superproteção
Quando vês o teu filho a chorar por algo pequeno, ou a ficar desconsolado por uma palavra mais dura, é natural que queiras protegê-lo. Mas cuidado: proteger não é o mesmo que evitar todas as dores.
Se tentares resolver tudo por ele, evitar que se magoe, ou impedir que enfrente frustrações, estás a passar (sem querer) a mensagem de que ele não consegue lidar com o mundo. E isso mina a sua autoestima.
A verdadeira ajuda é estar presente, validar o que sente, e ajudá-lo a desenvolver ferramentas para lidar com as emoções, sem o fechar numa bolha.
Como Apoiar uma Criança Sensível
1. Aceita sem corrigir
A primeira coisa que uma criança sensível precisa é de saber que não há nada de errado com ela. Frases como:
- “Estás sempre a chorar por tudo.”
- “Isso não é razão para ficares assim.”
- “Tens de ser mais forte.”
… podem parecer inofensivas, mas dizem à criança que os seus sentimentos são exagerados ou errados. Em vez disso, tenta algo como:
- “Vejo que isso te deixou mesmo triste.”
- “É difícil quando as coisas não correm como queríamos, não é?”
- “Queres um colo ou preferes estar sozinho um bocadinho?”
Validar é reconhecer sem julgar. E isso acalma o sistema emocional da criança.
2. Ensina a dar nome ao que sente
As crianças sensíveis vivem um turbilhão interno, mas muitas vezes não conseguem explicar o que se passa. Ajuda muito quando conseguem pôr palavras nas emoções.
Podes usar livros sobre emoções, cartões ilustrados, ou situações do dia-a-dia para perguntar:
- “Pareces triste ou estás mais zangado?”
- “Essa sensação no peito parece medo ou nervosismo?”
- “Queres desenhar como te sentes?”
Dar nome à emoção ajuda a organizar o que está cá dentro e torna o sentimento mais gerível.
3. Prepara o terreno emocional
Ambientes imprevisíveis ou caóticos são difíceis para crianças sensíveis. Pequenas mudanças ajudam:
- Antecipar o que vai acontecer (“Hoje vamos a um sítio novo, pode ser estranho no início, mas eu estou contigo.”)
- Criar rotinas e momentos calmos ao longo do dia.
- Reduzir estímulos quando estão mais cansados (menos barulho, menos luz, menos exigência).
É como regar uma planta delicada: não é preciso superproteger, mas criar condições para crescer bem.
4. Ensina estratégias de regulação
As emoções vêm com força e o objetivo não é apagá-las, mas ajudar a criança a atravessá-las com segurança.
Ensina-lhe coisas simples, como:
- Respirar fundo como um balão a encher e esvaziar.
- Usar um “cantinho da calma” com almofadas, livros ou objetos reconfortantes.
- Ter uma “mala SOS emocional” com desenhos, cheiros ou brinquedos que a ajudam a acalmar.
Com o tempo, a criança percebe que não precisa de fugir das emoções, pode aprender a regulá-las.
5. Cria um ambiente onde o erro é permitido
Crianças sensíveis são muitas vezes perfeccionistas. Têm medo de errar, de desiludir, de “não estar à altura”. Por isso, é essencial mostrar que errar é parte de aprender.
Podes partilhar os teus próprios erros com humor e empatia:
- “Hoje entornei café em cima do computador! Que chatice… respirei fundo e fui buscar papel para limpar.”
- “Fiquei tão nervoso na reunião que me esqueci do que ia dizer. Mas está tudo bem. Acontece.”
Isto ajuda a quebrar a ideia de que tudo tem de ser perfeito e ensina resiliência.
6. Fala sobre os “superpoderes” da sensibilidade
Ajudar uma criança sensível a gostar de quem é passa também por destacar as coisas boas dessa sensibilidade:
- “És muito atento aos sentimentos dos outros.”
- “Reparaste num pormenor que ninguém viu. Isso é incrível.”
- “Sabes quando alguém precisa de um abraço sem que te digam nada. Isso é raro.”
Quando a criança se começa a ver como “especial” e não como “frágil”, cresce a autoestima.
7. Usa o brincar como ferramenta emocional
Brincar é a linguagem natural da criança e pode ser usada como forma de expressar e explorar sentimentos. Os jogos ajudam a:
- Nomear emoções.
- Recontar experiências difíceis com segurança.
- Ensaiar formas de reagir em momentos desafiantes.
Por exemplo, jogos como o “Sabes Quem Tu És?” da Emoty Games foram criados precisamente para isso: ajudar a explorar o mundo emocional de forma divertida, leve e profunda. Através de cartas com perguntas, desafios e expressões, a criança vai partilhando o que sente sem sentir que está a ser “avaliada”.
O jogo transforma conversas difíceis em momentos de ligação. E, para crianças sensíveis, sentir-se ouvida e compreendida é meio caminho andado para ganhar confiança emocional.
Conclusão: Ser Sensível Não É Ser Frágil
Uma criança sensível não precisa que cries uma redoma à volta dela. Precisa de segurança, validação e ferramentas para crescer com a sua sensibilidade e não apesar dela.
Quando mostras que sentires muito não é um problema, mas sim um dom que pode ser afinado, estás a dar-lhe uma base sólida para se tornar num adulto empático, criativo e emocionalmente consciente.
Apoiar sem superproteger é um equilíbrio desafiante, sim. Mas cada vez que escutas sem julgar, ensinas sem gritar e acolhes sem apagar a emoção, estás a fazer exatamente isso: a mostrar que é possível sentir muito e, ainda assim, estar bem.
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