Como Ajudar uma Criança a Lidar com a Frustração

Como Ajudar uma Criança a Lidar com a Frustração

“Quero aquele brinquedo, agora!” “Não consigo fazer este desenho! Está horrível!” “Já não quero brincar!”

 

Se estas frases te soam familiares, respira fundo: não estás sozinho. Lidar com a frustração infantil é um dos maiores desafios para quem educa. A boa notícia? Compreender o que está por detrás destes comportamentos e aprender a agir com intenção pode transformar momentos de crise em oportunidades de crescimento emocional.

 

Neste artigo, vais perceber por que razão a frustração é tão difícil de gerir na infância, como podes ajudar a criança a desenvolver tolerância à frustração e como os jogos podem ser aliados nesta missão.

 

O Que É a Frustração Infantil?

A frustração é o que sentimos quando algo que queríamos muito não acontece, quando os nossos desejos, necessidades ou expectativas são contrariados. Para os adultos, isso pode significar perder um comboio. Para uma criança, pode ser não conseguir apertar os atacadores ou não ganhar um jogo.

 

Na infância, tudo é mais intenso. O cérebro ainda está em desenvolvimento, a linguagem emocional está em construção e a perceção do tempo é limitada. Por isso, um “não” pode parecer o fim do mundo, e esperar cinco minutos pode parecer uma eternidade. A frustração, para uma criança, é uma emoção avassaladora que nem sempre consegue nomear, muito menos regular.

 

Porque é Tão Difícil Lidar com Frustração Infantil?

 

1. Desenvolvimento cerebral em curso

O córtex pré-frontal que é responsável pelo autocontrolo, tomada de decisão e regulação emocional, está longe de estar amadurecido nas crianças pequenas. Isso significa que elas têm mais dificuldade em “parar para pensar” antes de reagir. A emoção toma conta do corpo e da mente. Além disso, a amígdala cerebral, ligada às reações emocionais, é especialmente ativa na infância. Quando a criança sente frustração, essa parte do cérebro ativa-se como se estivesse em perigo. E o corpo responde com choro, gritos ou birras, como forma de descarregar essa tensão.

2. Pouco vocabulário emocional

Se tu não sabes o nome da emoção que estás a sentir, como podes geri-la? As crianças, especialmente as mais pequenas, têm ainda um vocabulário emocional reduzido. Muitas vezes expressam-se através do corpo: batem com o pé, atiram objetos, choram, porque ainda não conseguem dizer: “Sinto-me frustrado porque queria fazer isto sozinho.”

3. Expectativas pouco realistas

As crianças vivem muito no imediato. Não têm ainda a capacidade de prever consequências a longo prazo ou de aceitar que “não é agora, mas pode ser depois”. Para elas, não conseguir algo no momento é percebido como uma falha pessoal ou um castigo injusto.

4. Modelos emocionais insuficientes

Se os adultos à volta também têm dificuldade em lidar com a frustração, as crianças não têm referências de como reagir de forma equilibrada. Quando vêem um adulto a gritar ou desistir perante uma dificuldade, aprendem que essa é a resposta normal à frustração.

5. Falta de experiências de treino emocional

Tal como os músculos precisam de treino para ficarem fortes, a tolerância à frustração também se desenvolve com prática. Se a criança for constantemente protegida de falhar, errar ou esperar, não cria espaço para aprender a lidar com a frustração. Evitar todos os desafios ou “amortecer” constantemente os obstáculos pode parecer amor, mas acaba por dificultar o crescimento emocional.

 

Como Ajudar uma Criança a Lidar com a Frustração

 

1. Valida o que ela sente

Antes de correres para resolver o problema, para. Baixa-te ao nível da criança, olha-a nos olhos e diz algo como: “Eu sei que estás frustrado porque querias muito fazer isso sozinho.”
Validar não é o mesmo que concordar com o comportamento. É reconhecer que a emoção existe, que tem um motivo legítimo, e que é natural sentir-se assim.

Quando validas, estás a enviar a mensagem de que ela é vista e compreendida. Isto, por si só, já ajuda o cérebro a sair do “modo alerta” e entrar num estado mais calmo. A criança sente-se segura para lidar com o que está a acontecer.

 

2. Dá nome à emoção

Muitas vezes, o que parece um “mau comportamento” é apenas uma emoção mal compreendida. Ajuda a criança a identificar o que está a sentir. Podes usar livros com emoções, bonecos com expressões faciais, cartas ilustradas ou simplesmente descrever:
“Estás a sentir frustração. Isso acontece quando queremos muito uma coisa e não conseguimos.”
Dar nome à emoção é como acender a luz num quarto escuro, de repente, o que parecia assustador torna-se mais claro e compreensível.

 

3. Ensina a parar e respirar

As técnicas de respiração são ferramentas simples e poderosas. Ensina a criança a parar, colocar a mão na barriga e inspirar profundamente pelo nariz, contando até três, e a expirar pela boca, lentamente.


Usa imagens que ajudem a visualizar:
“Cheira a flor... e sopra a vela.”
“Faz de conta que estás a encher um balão com o ar do nariz e depois o deixas sair devagar.”
Treinar esta habilidade quando a criança está calma ajuda-a a lembrar-se dela nos momentos de maior tensão.

 

4. Conta histórias de superação

Partilha situações em que tu próprio te sentiste frustrado e o que fizeste para ultrapassar isso. Podes dizer:
“Sabes, ontem fiquei mesmo frustrado porque o carro não pegou. Apeteceu-me gritar! Mas parei, respirei fundo e depois pedi ajuda.”
Ou usa histórias com personagens que falham, se sentem tristes ou zangadas, mas aprendem com a experiência. As crianças identificam-se com essas narrativas e começam a perceber que a frustração faz parte do caminho, e não é um sinal de fracasso.

 

5. Permite pequenas frustrações (em segurança)

Não faças tudo por ela. Deixa-a tentar apertar o fecho, montar o puzzle ou resolver um desentendimento com um colega. Mesmo que demore. Mesmo que falhe. Estar presente, mas não intervir de imediato, dá-lhe espaço para experimentar a frustração sem medo.
Se ela disser “não consigo”, podes responder:
“Ainda não consegues… mas continua. Eu estou aqui contigo.”
Este tipo de vivências, acompanhadas com empatia, ensinam resiliência emocional na prática.

 

6. Elogia o esforço, não o resultado

Quando valorizas o esforço e não só o sucesso, estás a mostrar que o importante é tentar, aprender e crescer. Isso ajuda a criança a perceber que falhar não é sinónimo de ser “menos capaz”.Diz frases como:
“Vi como continuaste a tentar mesmo depois de ter corrido mal.”
“Fiquei orgulhoso de ti por respirares fundo em vez de atirares os lápis.”
Este tipo de reforço positivo cria um ambiente onde o erro é bem-vindo como parte da aprendizagem.

 

7. Cria estratégias visuais

As crianças beneficiam muito de apoios visuais. Um cartaz com expressões faciais e nomes das emoções, uma escala de frustração com cores (por exemplo: verde = calmo, amarelo = a ficar frustrado, vermelho = estou a explodir), ou até um plano simples que ela possa seguir em momentos difíceis.

Exemplo de um plano de ação:

1) Sinto-me frustrado

2) Paro e respiro

3) Peço ajuda

4) Tento outra vez

Estes passos funcionam como um “manual de emergência emocional” que a criança pode seguir sempre que precisar.

 

8. Joga jogos que treinam tolerância à frustração

Brincar é a linguagem natural da criança. Jogos com regras, turnos e possibilidade de perder são oportunidades valiosas para lidar com frustração de forma leve.
Jogos como o “Sabes Quem Tu És?” podem ser especialmente úteis.

Além de permitirem explorar emoções através de perguntas, desafios e mímicas, criam um espaço seguro para refletir sobre situações reais. Quando a criança fala de algo que a frustrou, mas fá-lo dentro de um jogo, o tema torna-se mais acessível e menos ameaçador.

 

9. Dá o teu exemplo

És o espelho emocional da criança. Se te vês a reagir com frustração, mostra-lhe como estás a lidar com isso:
“Hoje fiquei muito frustrado porque perdi um ficheiro do computador. Estava mesmo irritado, mas depois fui dar uma volta, respirei fundo e consegui pensar numa solução.”
Estes momentos ensinam muito mais do que qualquer explicação teórica. A criança aprende observando — e tu és o seu maior professor.

 

10. Sê paciente e consistente

Desenvolver tolerância à frustração é um processo que demora anos. Não se trata de evitar birras, mas de dar ferramentas para que, com o tempo, a criança aprenda a lidar com elas.
Haverá momentos em que tudo corre bem… e outros em que parece que todo o trabalho foi por água abaixo. É normal. O mais importante é a tua presença constante e a repetição das estratégias com empatia.

Lembra-te: cada momento difícil é uma oportunidade de crescimento emocional, tanto para a criança como para ti.

 

Conclusão

 

Lidar com a frustração infantil não é tarefa fácil, mas é uma das mais importantes que podes assumir como educador ou cuidador. Ao ajudar uma criança a reconhecer, aceitar e regular a frustração, estás a construir as bases da resiliência, da empatia e da autoestima.

Mais do que evitar as lágrimas ou os gritos, o teu objetivo é ensinar-lhe que sentir frustração faz parte da vida e que há formas de lidar com isso. Com paciência, escuta e estratégias práticas, estarás a dar-lhe uma das competências mais valiosas para o presente e para o futuro.

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