Os jogos fazem parte natural do universo das crianças. Através do brincar, elas exploram o mundo, experimentam papéis, enfrentam desafios e expressam emoções. Mas o que talvez nem todos saibam é que os jogos emocionais, podem ser ferramentas transformadoras, especialmente quando usados em escolas e contextos terapêuticos.
Neste artigo, vais descobrir como os jogos emocionais em educação podem ser integrados de forma prática e eficaz tanto em salas de aula como em sessões terapêuticas. Vais perceber que não é preciso ser terapeuta ou professor de educação emocional para começar: basta ter intenção, sensibilidade e as ferramentas certas.
O Que São Jogos Emocionais?
Jogos emocionais são atividades lúdicas pensadas para desenvolver competências socioemocionais. Através deles, as crianças aprendem a identificar o que sentem, a expressar-se de forma saudável, a reconhecer emoções nos outros, a praticar empatia e a experimentar estratégias de regulação emocional.
Por exemplo, um jogo onde a criança tira uma carta com uma emoção (como medo, alegria ou raiva) e partilha uma situação em que sentiu aquilo. Ou então faz uma mímica da emoção, para os colegas adivinharem — ao mesmo tempo que treina a leitura da linguagem não verbal.
Por Que Usar Jogos Emocionais em Educação?
Aprendizagem mais eficaz
As emoções influenciam diretamente a forma como aprendemos. Se a criança está em stress, medo ou frustração, o seu cérebro entra num estado de alerta: o chamado “modo sobrevivência”. Nessa fase, o cérebro desliga-se das áreas responsáveis pela aprendizagem e foca-se apenas em garantir a segurança. É como tentar encher um copo que já está virado para baixo: por mais que tentes, nada entra.
Por outro lado, quando a criança se sente segura, acolhida e emocionalmente equilibrada, o seu cérebro ativa as zonas de raciocínio, memória e criatividade. É aí que a aprendizagem acontece de forma mais natural, fluída e duradoura.
Os jogos emocionais ajudam precisamente a criar esse ambiente emocional positivo. Antes de uma aula exigente ou após um intervalo agitado, um jogo que trabalha emoções pode recentrar o grupo, diminuir a ansiedade e aumentar a atenção.
Prevenção de problemas emocionais e comportamentais
Nem todos os comportamentos “difíceis” de uma criança são sinais de desobediência. Muitas vezes, são pedidos de ajuda mal expressos. A criança que interrompe, empurra ou responde mal pode estar a lidar com frustração, medo ou tristeza sem saber como expressar isso de forma adequada.
Quando introduces jogos emocionais na rotina escolar, dás à criança ferramentas para identificar o que sente e pedir ajuda de forma mais saudável. Com o tempo, em vez de explodir num grito ou agressão, ela aprende a dizer “estou irritado” ou “preciso de me acalmar”.
Estudos longitudinais mostram que programas escolares baseados no desenvolvimento socioemocional reduzem significativamente os comportamentos disruptivos e aumentam a cooperação e o foco dos alunos (Durlak et al., 2011). E o mais interessante? Estes benefícios estendem-se por vários anos, mesmo depois do fim dos programas.
Pensa nos jogos como uma “vacina emocional”: ao praticar empatia, autocontrolo e escuta em situações lúdicas, a criança fortalece os seus recursos internos e previne dificuldades futuras.
Promoção da empatia e do respeito
Vivemos num tempo em que o contacto humano é muitas vezes substituído por ecrãs, mensagens rápidas e pouca escuta real. Os jogos emocionais vêm contrariar essa tendência, convidando as crianças a ouvir com atenção, esperar pela sua vez, respeitar regras e, sobretudo, colocar-se no lugar do outro.
Quando uma criança joga e ouve um colega a partilhar que sentiu medo durante uma visita ao médico, ou que ficou triste por não ser escolhido para uma equipa, aprende a reconhecer que os outros também sentem. E isso é a base da empatia.
Estes momentos de partilha no jogo criam laços entre os alunos, diminuem o julgamento e aumentam o respeito mútuo. A empatia deixa de ser uma teoria ou uma regra e passa a ser uma experiência vivida.
Jogos como “Eu já senti…” ou “Imita esta emoção e conta uma história” criam pontes entre os alunos, reforçando a ideia de que todos temos sentimentos parecidos, mesmo quando reagimos de formas diferentes.
A investigação em psicologia do desenvolvimento confirma que a empatia é uma competência treinável — e que os contextos lúdicos são dos mais eficazes para esse treino (Denham & Burton, 2003).
Como Usar Jogos Emocionais em Contexto Escolar
1. Integrar nas rotinas da sala de aula
Os jogos emocionais podem (e devem!) ser usados com frequência, sem que para isso precises de reorganizar o teu horário ou criar sessões especiais. Pequenos momentos diários, consistentes e descontraídos são extremamente eficazes para promover o desenvolvimento emocional.
Ao iniciares a semana com uma breve atividade ou ao fechares o dia com uma roda de partilha, estás a ajudar as crianças a criar hábitos de autorreflexão e escuta emocional. Estes momentos também favorecem a coesão do grupo e aumentam a sensação de pertença na turma.
Um exemplo pode ser uma roda rápida onde cada criança tira uma carta com uma emoção e diz: “Hoje senti-me…” com base nessa emoção. É uma excelente forma de promover a consciência emocional e começar (ou terminar) o dia com empatia e conexão.
2. Adaptar ao conteúdo curricular
Os jogos emocionais não precisam de ser tratados como algo separado do currículo, podem ser uma ponte entre o desenvolvimento académico e emocional. Ao integrares jogos nos conteúdos que já estás a trabalhar, aumentas a motivação dos alunos e reforças a aprendizagem através da emoção.
Durante a leitura de um texto, podes explorar as emoções das personagens; numa aula de ciências, podes relacionar os efeitos das emoções no corpo; e em cidadania, podes usar jogos para debater temas como justiça, empatia ou respeito.
Se estiveres a ler uma história, podes fazer uma pausa e perguntar: “Que emoção achas que esta personagem está a sentir?” ou “Se fosses amigo dela, o que poderias fazer?” Assim, os alunos treinam empatia e literacia emocional enquanto desenvolvem competências de leitura crítica e expressão oral.
3. Usar jogos como ferramenta de gestão de conflitos
Os conflitos entre crianças são naturais, mas podem ser oportunidades valiosas de aprendizagem emocional, se forem bem acompanhados. Em vez de recorrer apenas a conversas corretivas, introduz jogos que promovam o reconhecimento de emoções e a troca de perspetivas.
Estes jogos permitem que as crianças revisitem os conflitos de forma simbólica, com menos defensividade e mais abertura à mudança. Ao brincar, desligam o modo “ataque-defesa” e tornam-se mais recetivas a novas formas de agir.
Por exemplo, um jogo em que dois colegas têm de representar, um do outro, como se sentiram durante um conflito. Este tipo de exercício favorece o reconhecimento mútuo, desbloqueia tensões e fortalece a empatia.
Como Usar Jogos Emocionais em Sessões Terapêuticas
1. Como porta de entrada para a conversa
Em contexto terapêutico, muitos jogos funcionam como facilitadores da comunicação. Algumas crianças têm dificuldade em identificar ou verbalizar o que sentem, seja por falta de vocabulário emocional, seja por medo ou vergonha. O jogo permite que a criança se expresse de forma indireta, mais confortável e segura. Quando a criança joga, relaxa, sente-se no controlo e, muitas vezes, partilha espontaneamente o que não diria numa conversa direta.
Por exemplo, Um jogo como o “Sabes Quem Tu És?” convida a criança a responder a perguntas como “Conta uma história em que sentiste orgulho” ou “Imita uma emoção que tenhas sentido esta semana”. Ao brincar, ela vai revelando emoções, pensamentos e experiências pessoais, criando uma base rica para o trabalho terapêutico.
2. Para trabalhar temas específicos
Certos jogos permitem que trabalhes intencionalmente emoções ou temas concretos. Se estás a acompanhar uma criança com dificuldades em lidar com a raiva, a vergonha ou o medo, podes usar jogos que tragam essas emoções à tona de forma simbólica, segura e controlada. Este tipo de abordagem permite explorar conteúdos emocionais difíceis com mais leveza e naturalidade, sem que a criança sinta que está “na terapia”.
Jogos de mímica, cartas com metáforas visuais, dramatizações ou desafios como “que emoção esta imagem transmite?” são formas eficazes de abordar emoções sem confronto direto. Ao representar uma personagem ou responder a um desafio simbólico, a criança fala de si através de outra figura — o que lhe dá liberdade e proteção.
3. Para promover a regulação emocional
A regulação emocional não se ensina apenas com explicações — treina-se em contexto. Jogos que envolvem regras, turnos, desafios inesperados ou exigem estratégias ajudam a criança a desenvolver o autocontrolo de forma prática. Estes jogos criam oportunidades para observar e trabalhar impulsividade, frustração ou dificuldade em esperar, de forma colaborativa e sem julgamento.
Por exemplo, jogos em que há penalizações leves por interromper, ou onde a criança tem de interpretar pistas emocionais para adivinhar o que o outro sente, incentivam o foco, a escuta e a empatia. São especialmente úteis para trabalhar com crianças com dificuldades de autorregulação ou diagnóstico de perturbações de comportamento.
Dicas Para Escolheres o Jogo Emocional Certo
- Pensa na idade da criança. Jogos mais visuais funcionam melhor com os mais novos. Os mais velhos gostam de desafios e perguntas mais abstratas.
- Define o objetivo. Queres trabalhar empatia? Autoconhecimento? Gestão da raiva? Escolhe um jogo que se foque nisso.
- Considera o tempo disponível. Há jogos rápidos (5-10 minutos) e jogos mais longos para sessões inteiras.
- Verifica o contexto. Alguns jogos são ótimos para grupos; outros, mais íntimos, funcionam melhor num ambiente terapêutico.
E os Benefícios a Longo Prazo?
Quando usas jogos emocionais com regularidade, vais começar a notar pequenas grandes mudanças:
- As crianças começam a expressar o que sentem com mais facilidade.
- Os conflitos reduzem-se, porque sabem falar antes de agir.
- A turma ou o grupo terapêutico torna-se mais coeso e empático.
- As crianças ganham ferramentas que vão usar para toda a vida — na escola, nas amizades, no futuro trabalho, e até na parentalidade.
É como plantar sementes invisíveis: hoje estás só a jogar um jogo, mas amanhã essa criança pode usar o que aprendeu para resolver um conflito, apoiar um amigo ou fazer escolhas mais conscientes.
Alguns educadores ou terapeutas podem pensar: “Mas brincar não é tempo perdido?” ou “Não será melhor falar diretamente com a criança?”
A resposta é clara: o jogo não é o oposto do ensino — é a sua melhor forma disfarçada. Quando se trata de emoções, o jogo tem o poder de aceder ao mundo interno da criança com menos resistência, mais segurança e mais verdade.
Se trabalhas com crianças, seja numa escola, num consultório ou mesmo em casa, os jogos emocionais em educação são aliados poderosos. São pontes entre o mundo emocional da criança e o mundo exterior. E, mais do que isso, são oportunidades para que cresçam mais conscientes, empáticas e equilibradas.
Queres começar? Explora os nossos jogos pensados para escolas, famílias e profissionais de saúde mental. Vais ver que não só vais ensinar emoções — como vais fortalecer relações, facilitar aprendizagens e transformar o clima emocional à tua volta.
Referências
- Durlak, J. A., Weissberg, R. P., Dymnicki, A. B., Taylor, R. D., & Schellinger, K. B. (2011). The impact of enhancing students’ social and emotional learning: A meta‐analysis of school‐based universal interventions. Child Development, 82(1), 405–432.
- Denham, S. A., & Burton, R. (2003). Social and Emotional Prevention and Intervention Programming for Preschoolers. Springer.
- Greenberg, M. T., & Kusché, C. A. (1993). Promoting Social and Emotional Development in Deaf Children: The PATHS Project. University of Washington Press.
Deixar comentário
Este site está protegido pela Política de privacidade da hCaptcha e da hCaptcha e aplicam-se os Termos de serviço das mesmas.